Qualquer apaixonado pela ciência da política, ou pela filosofia do direito, idolatra as aventuras de Josiah Bartlet, ficcionado presidente dos EUA em “West Wing”. Nesta excelente série, éramos transportados para os bastidores da Casa Branca, para o dia-a-dia presidencial e a relação com o sistema político-constitucional americano. Mais que uma admirável série, "West Wing" tornou-se num verdadeiro manual de ciência política e direito constitucional, na medida em que eram exploradas ao detalhe as ‘nuances' do desenho institucional Norte-Americano, desde a relação entre a presidência e o congresso, os limites dos poderes presidenciais, o papel do TC, o principio de separação de poderes, os limites à constituição (e o legado dos ‘founding fathers') ou os mecanismos de ‘checks and balances'.
Ora os recentes episódios da vida política portuguesa - a demissão de Relvas, o chumbo parcial do OE pelo TC, o aval presidencial ao Governo, a birra vingadora do primeiro-ministro - e a forma como foram interpretadas as intervenções dos nossos actores institucionais, oferecem um excelente contraponto à performance norte-americana, demonstrando que, no caso português, somos diariamente expostos a uma telenovela de lixo, com péssimos actores, um deplorável ‘casting', e com cenas de um doloroso guião (escrito em excel) dobradas para português macarrónico, agradando audiências estrangeiradas.
Ficámos assim a saber, pelos recentes retalhos da vida política nacional, que afinal a ideia de separação de poderes é um conceito elástico, funcional apenas se condizente com os ensejos governamentais; que o TC, figura tutelar dos pilares da nossa democracia, é um mesquinho micro-partido de oposição que, com os seus 13 membros, intriga em ceias conspirativas contra a benevolência do Governo; e que a figura do Presidente, guardião-mor dos textos fundamentais, resume-se afinal a servir de muleta do presidente do Conselho (leia-se primeiro-ministro) não só validando uma governação fora-da-lei (constitucional) como a absorvendo como sua. Um Presidente da República politicamente impune, recorde-se, pois nenhuma figura jurídica de ‘impeachment' temos consagrada.
E se já sabíamos que a direita portuguesa tinha um ‘parti pris' contra a Constituição assinada por Sá Carneiro (tema para outro artigo), sabemos agora que, segundo o primeiro-ministro, são afinal os 13 malvados que prezam pela sua aplicação os responsáveis pela ‘debacle' governativa. E é esta a ‘plot' final, de extrema preocupação, da trama nacional, pois prepara-se Passos Coelho, como cínico vingativo, para aproveitar o chumbo parcial do OE para inaugurar a fase final do desmantelamento do Estado Social português.
E com isso finalmente transformar Portugal num País-coutada de privados, afilhados e chicos-espertos. Mas que se desengane, o primeiro-ministro, e que a sua desculpa perfeita se transforme em oportunidade perfeita para o País se unir contra a forma, o feitio e o conteúdo da linha governamental. Porque todos já entendemos que este elenco e este guião se encontram mais próximos de ficções desenhadas em Bruxelas ou Berlim que da realidade e do quotidiano nacional.
José Reis Santos, Historiador
(publicado no Diário Económico de 9 de Abril de 2013)
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